Pular para o conteúdo principal

DESFILE DAS ESCOLAS DE SAMBA DO RIO DE JANEIRO: UMA BELEZA E....UMA CHATURA

É carnaval. Meus filhos resolvem viajar e ficamos eu e minha mulher em casa, a resolver o que fazer.Em dúvida sobre para onde ir, resolvemos ficar por aqui mesmo, em BH, terra sem carnaval, terra de descansar nesta época. À noite minha mulher vai dormir e fico na TV, assistindo ao desfile das escolas de samba do Rio de Janeiro. Tudo é muito bonito, a empolgação, as cores, as mulheres bonitas, os carros alegóricos. Minha mente viaja no significado de tudo aquilo misturado ao silêncio desta noite solitária. Primeiro penso na função e na importância da fantasia. O carnaval é um sonho acordado, uma versão multiplicada e emocionante do processo imaginativo que fazemos na terapia. A utopia em imagens, a catarse fenomenológica de nosso inconsciente. A sétima maravilha que o Brasil tem coragem de fazer. Apesar disso, à medida que o desfile vai se processando, vou achando tudo uma chatura. Toda a criatividade vai morrendo diante do samba repetitivo e forçado a ser ligado a um enredo, os figurantes muito mais interessados em aparecer na TV do em que curtir o samba, meros curiosos do carnaval que compram fantasias para se divertirem(o que é lícito e deve ser ótimo, mas não têm identidade com a escola, a comunidade, o próprio enredo) e andam na pista perdidos e como soldados. Um exército. É assim que me veio a imagem do desfile de escola de samba. Parecia um desfile de sete de setembro. Cada um com sua farda marchando para o mesmo lugar, com hora para chegar, ao som de um ritmo que mais parece uma marcha de guerra. Esquisito, mas foi a sensação que tive.
No dia seguinte, ao acordar, comentei com minha mulher que achava que precisávamos recriar o carnaval. Como? Eu fiz a sugestão: as escolas deveriam desfilar com menos figurantes, diminuir o número deles pelo menos à metade, para que tenham espaço e tempo para desfilar; cada ala deve ter seu próprio carro alegórico, menor e correspondente ao seu tema, e os figurantes de cada ala devem ter sua coreografia ensaiada, como a comissão de frente, espaço para sambarem com samba no pé que precisa ser ensinado a todos, na verdadeira função de ESCOLA de samba; os carros alegóricos devem ser menores e mais criativos, com movimentos vivos e menos imagens de animais e figuras humanas, menos óbvios; o samba enredo não precisa seguir rigorosamente o tema, nem descrevê-lo co começo ao fim, pode ser apenas um toque do tema, como por exemplo, se o tema for Portinari o samba pode ser sobre o retirante, o cafezal, o pincel...algo mais fácil de fazer; o tempo de desfile deve ser indeterminado, mesmo que comece na sexta feira e acabe na quarta de manhã
para que nada interfira na performance da escola. Sei que poucas das coisas sugeridas acontecerão, já que o carnaval é um produto de turismo e vive disso, mas minha utopia talvez valha para cidades menores, carnavais menores, como o de minha cidade, por exemplo.

Comentários

Postagens mais visitadas deste blog

O MAU EXEMPLO DE HILDEBRANDO E A GENIALIDADE DE DRUMMOND

Para os amantes da poesia Carlos Drummond de Andrade é um prato maravilhoso. Drummond é profundo, é enigmático, é incisivo. Seu ponto é exato, como a guitarra de George Harrison, a concisão de Machado de Assis(perdoem-me os exemplos tão díspares, mas foram os que me ocorreram nesse momento). Mesmo quando estamos diante de um suposto Drummond menor, somos surpreendidos. Vou dar um exemplo: encontra-se no livro A PAIXÃO MEDIDA, um dos que mais gosto. Leio o poema O SÁTIRO e o acho bobo, grosseiro, indigno de Drummond. Mas acontece que trabalho com violência sexual. Sou médico e atendo à mulheres em situação de violência sexual e doméstica todos os dias. De repente, o poema de Drummond soa como uma bomba para mim. Corro ao dicionário e a minha suspeita se personifica. É um poema simbólico, tem uma dimensão maior. Vou escrevê-lo abaixo e tentar explicar a dimensão que consigo ver nele. O SÁTIRO Carlos Drummond de Andrade(do livro A Paixão Medi

NO DESCOMEÇO ERA O VERBO

Quem não conhece a célebre acepção bíblica " No começo era o verbo"(João 1,1)? Esta frase é uma das mais enigmáticas do livro sagrado, e como interpretá-la? Na bíblia que tenho em casa(Paulus,1990 edição Pastoral) há um comentário com a seguinte inscrição, logo abaixo do prólogo ao evangelho de São João, que começa com a frase acima( minha bíblia está escrito como " no começo a Palavra já existia". "No começo, antes da criação, o Filho de Deus já existia em Deus, voltado para o Pai: estava em Deus, como a Expressão de Deus, eterna e invisível. O filho é a Imagem do Pai, e o Pai se vê totalmente no Filho, ambos num eterno diálogo e mútua comunicação............Jesus, Palavra de Deus, é a luz que ilumina a consciência de todo homem.......para isso a Palavra se fez homem e veio à sua própria casa, neste seu mundo........A humanidade já não está condenada a caminhar cegamente, guiando-se por pequenas luzes no meio das trevas, por pequenas manifestações de D

DISTRAÍDOS VENCEREMOS?

Aconteceu quarta-feira passada.  Caiu uma tempestade de vento, árvores tombaram, carros afundaram, gente afogou, mas o que me afetou mesmo foi que a luz apagou. Apagou e não voltou. Sozinho em casa, sem luz, sem fósforos, sem velas, vi-me na única opção clarividente de ligar o notebook . Encontrei meu livro, baixado do Amazon. Comecei a lê-lo às sete da noite, na escuridão ao redor,  e fiquei a lê-lo até as vinte e três. Que bela experiência. As lembranças inundaram-me: do tempo em que Guarani tinha postes baixinhos de luz fraca, onde besouros faziam piquenique, o ocaso,a penumbra, a viagem para dentro. Do tempo em que, criança, eu escutava novelas no rádio da fazenda, cuja energia vinha de um moinho d'água de onde a luz ia e vinha no lusco-fusco do quarto. Flertaram-me os dezembros sem fim de canoinhas de papel na correnteza da rua e  enchentes do incomodado Rio Pomba. Depois concentrei-me na leitura. O livro: O clube dos jardineiros de fumaça, de Carol Bensimon. Meu Kindle re