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A CORRUPÇÃO NOSSA DE CADA DIA



     



Sexta-feira à noite é dia de encontrar os amigos no bar. Lá estamos a discutir a vitória do Galo na final da Libertadores, o Futebol, a Política, o Papa no Brasil, as Manifestações, hora de colocar os papos em dia e, claro, tomar todas.

Comecemos pelo Futebol. A discussão caminha pelo coibir ou não a catimba no futebol. Aliás, um site argentino traduziu catimba para o espanhol como sendo “ uma palavra que o brasileiro usa para falar mal do futebol argentino”. A coisa vai por aí : como fazer com que o time adversário não pare o jogo a toda hora? Como impedir que o jogador que está ganhando faça cera?

Eu argumento que nos outros esportes isso já foi resolvido com o cronômetro oficial, o tira-teima, etc, mas eles argumentam que isso tiraria a “graça” do futebol...Eu argumento que a graça do esporte e´o próprio esporte e não a “catimba”...Eles relembram o gol de mão de Maradona na copa do mundo...eu lembro a eles que o jogador alemão Klose fez um gol de mão e avisou ao juiz que foi de mão para que ele pudesse impugná-lo...Eles riem; cara bobo.

Lembro a eles de um jogo entre Brasil e Japão, se não me engano em 2010, no qual ocorreu um momento curioso. O jogador brasileiro caiu machucado em campo e a bola estava em poder do jogador japonês que não viu o lance. O técnico brasileiro Dunga correu desesperado em direção ao jogador japonês exigindo que ele jogasse a bola para fora, o que ele fez imediatamente. O curioso do lance é que após a partida o jogador japonês queria entender o por quê da ira do técnico brasileiro, se ele iria, claro, jogar a bola para fora. Então disseram a ele que, no Brasil, quando o jogador cai , os outros o ignoram e continuam com o jogo.

Ele se espantou. Que selvagem!

Então lhe explicaram que no Brasil quando o jogador cai na maioria das vezes está fingindo de machucado para fazer o tempo passar. Chamam a isso de “catimba”.

Quando o jogador Neymar foi vendido ao Barcelona lhe explicaram que esse tipo de lance(fingir de machucado, tentar enganar o juiz para ele dar falta,  outros tipos de catimba....não podem ser feitos na Europa). Dificil para ele mudar porque aqui no Brasil já ensinam a “catimba” aos jogadores desde que são pequeninos.

Claro que a discussão nossa girava em torno da ....corrupção nossa de cada dia.

As manifestações, o momento político em que vivemos, vieram colocar em pauta toda a corrupção na política, mas é inevitável que ela nos remeta à corrupção que existe em todos nós desde o Império.

Então vamos lá.

Conta um de nossos amigos de bar que assistiu à seguinte cena : o amigo está na fila de banco para pagar as contas, é o famigerado quinto dia útil e a fila é grande. Ele então vê outro amigo entrando e o cumprimenta. O chegante fica conversando com ele na fila e então lhe faz a esperada solicitação: - Paga a minha conta para mim? O amigo em questão diz: - claro, pago, sob o olhar irado dos seguintes da fila. O amigo cara de pau vai para o lado e fica esperando. O amigo solícito chega até o caixa, paga somente a sua conta e volta para o final da fila. Então o amigo solicitante lhe diz?: - Porque está fazendo isso? Ele responde: - já paguei as minhas contas agora estou entrando novamente na fila para pagar as suas.

Os amigos do bar riem. É uma piada? Não, um caso verídico.

-Não pode ser.

-Mas foi.

Seguindo. Estou no supermercado fazendo compras e entro na fila preferencial de idosos onde vejo na minha frente uma senhora com dois carrinhos, sendo um cheio e outro vazio. Quando chega a hora dela se dirigir ao caixa ela me dá o lugar. Aí vejo que ela apenas está guardando o lugar para o filho de uns vinte anos, que fica indo e voltando até as prateleiras e enchendo o carrinho dela. Ela está “guardando lugar na fila” para o filho. No mesmo dia em outro caixa vejo uma moça com dois filhos “guardando lugar” na fila. Ela ocupa três caixas. Cada filho entra em uma fila e ela entra na terceira....o que chegar primeiro ao caixa muda de lugar...

Continuo.

Vou à drogaria, mas não estou indo comprar remédios. Vou comprar fita adesiva de empacotamento. Como, na drogaria? Sim.

A drogaria vende de tudo o que você quiser...inclusive remédios...então por que também a padaria não vende remédios ou a loja de variedades também não vende remédios? Mas isso é só um detalhe. Ao chegar ao caixa a fita custa oito reais e noventa e nove centavos. Odeio a corrupção dos noventa e nove centavos. É fazer pouco demais de nossa inteligência. Mas como sabemos não há como dar o troco de um centavo, porque esta moeda já foi tirada do mercado...então o um centavo vai ficar para a loja...Então sempre peço o troco...a moça do caixa tem que me dar cinco centavos e fica sempre irada com minha solicitação...Que cara mais pão duro.

Se for ficar citando todas as corrupções cotidianas e que se sucedem minuto a minuto  vou escrever umas quinhentas páginas, portanto vou ficar só com os pequenos exemplos acima.

Então, para concluir, temos que pensar que vivemos em uma sociedade cruelmente desumana e violenta em todas as suas relações: comerciais, urbanas, familiares, institucionais, etc....

Se queremos lutar contra os desmandos políticos, contra as desigualdades sociais, as discriminações, a insegurança, a violência, temos que começar por nós mesmos, no dia a dia, em cada uma de nossas ações, desde atravessar na faixa de pedestre quando o sinal estiver verde  até a insistente e consistente educação a nossos filhos a ética das relações dentro de casa.

Para que tudo, ao fim de algumas décadas, comece a dar certo.

Comentários

  1. comentário de Antônio Ângelo

    para mim
    É isto mesmo, Ramon. Vc colocou muito bem a questão.
    Vivemos apontando o dedo pros políticos - corruptos de grande calado, em sua maioria - e esquecemos que em nosso dia-a-dia praticamos atos que também mostram aquela nossa tendencia de "levar vantagem".
    E não vai ser fácil mudar esta cultura.

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  2. Comentário de Vergínia Rossato

    Gostei Ramon, a realidade resulta de pequenos atos e geralmente são passados despercebidos e todos nós cometemos erros e gostamos de criticar os outros, indicando na maioria das vezes que o outro é o problema.Reflexões como esta trazem a consciência nossa participação direta ou indireta em tudo que acontecee e que tem se mantido ao longo do tempo.

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